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Arte, Cultura e Pastelaria

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Simbologia na Páscoa

Graellsia, 05.04.12

    Ernesto Veiga de Oliveira dedica um artigo aos Folares e Ovos da Páscoa em Portugal na sua obra Festividades Cíclicas em Portugal. Seguirei, pois, as palavras do autor quase à letra. Após os meses de Inverno e a longa privação da Quaresma, a Páscoa dá início a uma intensa actividade em termos de preparações culinárias e de intercâmbio. A Páscoa é, pois, uma época característica de presentes cerimoniais, nomeadamente de natureza alimentar, os «folares». A palavra, porém, numa acepção restrita e mais precisa, designa um certo tipo de bola, específica do ciclo pascal.

 

    Como bola de Páscoa, existem, em Portugal, diferentes espécies de «folares»; o mais corrente e difundido é o de bolo em massa seca, doce, e ligada, feito com farinha de trigo, ovos, leite, azeite, banha, açúcar e fermento, e condimentado com canela e ervas aromáticas, geralmente erva-doce, – uma espécie de regueifa ou fogaça -, encimado, conforme o seu tamanho, por um ou vários ovos cozidos inteiros e em certos lugares tingidos, meio incrustados e visíveis sob as tiras de massa que os recobrem. Este tipo de «folares» constitui a regra quase sem excepção em todo o Sul do País, no Algarve e no Alentejo, e é corrente na Estremadura e nos arredores de Lisboa; no Centro do País, é ainda mais frequente nas Beiras, e encontra-se também na região do Douro. Contudo, no Nordeste montanhoso e no planalto de Trás-os-Montes, o «folar» é diferente. A massa leva farinha, ovos, leite, manteiga e azeite e encerra bocados de carne de toda a espécie – vitela, frango, coelho e, sobretudo, porco, presunto e rodelas de salpicão – cozidos dentro da massa.

 

    Conforme as regiões e localidades, os «folares» doces podem apresentar algumas variações e particularidades, no que respeita às suas formas; no Sul, eles são redondos, espessos e maciços, e comem-se no Domingo de Páscoa, ou em certos sítios, na Sexta-feira Santa, na Segunda-feira a seguir à Páscoa, ou mesmo, no final do Ciclo, em Domingo de Pascoela; nos arredores de Lisboa, eles têm uma forma ovalada; em Aveiro, a de um coração; etc. Em certas áreas do Alentejo, porém, como por exemplo na região de Elvas, os «folares» tomam aspectos zoomórficos, para os afilhados há os lagartos, borregos; para as raparigas, as pintainhas, pombas, bezerrinhas, borreguinhas. Em Castelo de Vide os namorados trocam entre si folares em forma de coração. E há os folares que simbolizam a fecundidade da mulher: o ninho, a galinha com os pintainhos em seu redor, a boneca grávida. O ovo está sempre presente – na boca do lagarto, no rabo da galinha, na barriga da boneca.

 

    O lagarto é símbolo do Sol e da Luz, aquele que busca o conhecimento, Deus, a outra vida.

 

    Ernesto Veiga de Oliveira refere-se ainda às regras determinadas em relação aos presentes cerimoniais da Páscoa, os «Folares». Assim, encontramos várias categorias de «Folares», com correspondência a situações sociais independentes,
tais como:

- Os presentes obrigatórios que os padrinhos dão na Páscoa aos seus afilhados;

- O óbulo que se oferece ao padre, em casa, quando da visita pascal, ou «compasso»;

- As ofertas determinadas que têm lugar na Páscoa entre pessoas ligadas por laços de parentesco genérico ou cerimonial.

 

    Pode dizer-se que as celebrações alimentares da Páscoa em Portugal representam a consagração do ovo «símbolo da fecundidade e abundância», nomeadamente no que se refere aos folares do Sul e Centro do País, onde surge incrustado inteiro, como elemento fundamental.

 

    Alguns historiadores sugerem também que muitos dos símbolos ligados à Páscoa, designadamente os ovos coloridos, bem como o coelhinho, são reminiscências da Festa da Primavera em honra de Eostre, a deusa da fertilidade, do Renascimento, da Ressureição, da Luz crescente da Primavera, na mitologia anglo-saxónica, cujo nome parece significar «Deusa da Aurora», festividades essas que foram assimiladas a Pessach.

    Pessach, (do hebraico, ou seja, passagem) também conhecida como Páscoa Judaica, associa-se, segundo o êxodo, à libertação do povo de Israel do Egipto.

 

    Regressando à Páscoa de origem germânica, referimos ainda que, em alemão, ainda hoje se designa a Páscoa por «Ostern» e em inglês «Easter».

Por essas filiações, há quem relacione a divindade Eostre com a Deusa grega Eos, também ela deusa do Amanhecer e ainda com a fenícia Astarte ou a babilónica Ishtar, pelas similitudes no que respeita aos rituais de fertilidade e às festividades do Equinócio da Primavera, sendo comum a Persas,
Romanos, Judeus e Arménios o hábito de trocar presentes de ovos coloridos.

 

    O Cristianismo acabou por absorver esta tradição através da Páscoa e, também por isso mesmo, o ovo aparece aqui ligado à ideia de renovação periódica da natureza. Remete assim ao mesmo mito da criação cíclica, mantendo-se a crença de que comer ovos no Domingo de Páscoa traz saúde e sorte durante todo o resto do ano, funcionando como algo de apotropaico contra as enfermidades.

 

            ... Votos de Páscoa Feliz, Saúde, Sorte e Alegre Renovação!

 

 

 

Fontes

BARATA, Filomena – Ludi Cereales – os ovos da Páscoa. In Portugal Romano – Revista de Arqueologia Romana. Abril, 2012

BARBOFF, Mouette – A Tradição do Pão em Portugal. Edição do Clube do Coleccionador dos Correios, 2011

OLIVEIRA, Ernesto Veiga de – Festividades Cíclicas em Portugal. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1984. 1ª ed.

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